Ontem comecei o dia bastante cedo, mais precisamente às sete e meia cheguei no restaurante para os procedimentos padrões que fazemos antes de abrí-lo. Até que o Michael apareceu lá pelas oito pedindo pra Mareen me liberar porque ele me precisava para “cleaning trails”. Apesar de eu não fazer a menor idéia do que era aquilo, voltei para o quarto e segui as intruções do Michael, para vestir as melhores roupas contra o frio que eu havia trazido. E lá fui eu com duas camisetas de algodão longas, um moletom especial, outro moletom normal e por cima de tudo isso aquele casaco grande vindo da Holanda. Dois pares de meia dentro da bota e luvas decentes para as extremidades. Antes de sairmos ainda pedimos para o Michael passar na loja de presentes do restaurante para comprarmos máscaras faciais, para proteger o rosto do frio. Não era pra menos, aqui no Lodge a temperatura era -15ºC, e haviam nos dito que a temperatura nas trilhas seria um tanto mais fria que isso. Além disso ainda usei “calças de neve”, um tipo de calça impermeável grande pra caramba que não tem elásticos, você prende nos ombros com suspensórios. Essas calças são tão grandes que eu usei a da esposa do Michael, e serviram.
Como não conseguimos colocar três pessoas em um snow-mobile, eu fui com o Michael enquanto o BS esperaria pelo Mark. E lá fui eu dar a minha primeira volta (que foi um bocado longa) de snow-mobile. Um veículo desses pode chegar a 200 km por hora, o velocímetro marca até 220. Como estávamos a trabalho, não passamos de sessenta, mantendo-nos a maior parte do tempo a menos de 15. O que era o trabalho: nós íamos seguir algumas trilhas de ski, e fazer a manutenção, ou, em outras palavras, deixar a neve mais fofa (que era feita com um tipo de grade engatada no snow-mobile), e remover as árvores caídas, galhos e pedras da área da trilha. (As trilhas eram cross-countri, uma modalidade de ski que não é uma ladeira, mas um tipo de “caminhada com skis”, não sei ao certo como funcionam).
Eu achei divertido trabalhar na trilha. Começou a nevar uma hora, aliás, nevou em quase todo o tempo que eu estava trabalhando, mas uma hora a neve ficou mais densa. O engraçado é que como ela é sólida, você passa a mão para removê-la dos ombros e da roupa antes que ela derreta e você fique molhado. (As roupas eram impermeáveis, mas ainda assim é melhor se manter seco). Bom, lá na trilha havia muito mais neve do que por aqui, um pouco mais de um “pé” (uns 20 cm, no meu cálculo tosco). Fiquei maravilhado em ver que os flocos de neve são exatamente iguais a como são desenhados. Eles são pequenos cristais, e você consegue ver aquele formato um tanto parecido com uma estrela que representa neve em tudo quanto é lugar. Somente quando ela está mais grossa, os flocos grudam um no outro, por isso parecem mais bolinhas brancas irregulares.
Até que não teve muito trabalho por lá. Uma ou outra árvore caída no caminho para cortar, alguns galhos mais finos, mas nada de muito difícil não. Só que eu fiquei quase seis horas exposto ao frio intenso, porque precisamos passar três vezes nas trilhas para afofar a neve, e como não podíamos ir muito rápido fazendo isso, foi mais como um grande passeio de snow-mobile do que um trabalho muito difícil.
Aliás, o Michael me deixou dirigir um pouco! Me senti como uma criança aprendendo a andar de bicicleta, ou então a dirigir, acelerando bem devagar, com os olhos fixos no caminho, e um medo gigante de fazer besteira. Mas é divertido!
Agora o frio: O BS não tinha botas adequadas, por isso os seus pés quase congelaram na primeira meia hora, o que fez com que o Michael o trouxesse de volta ao Lodge, enquanto eu fiquei com o Mark limpando a trilha e “passeando de snow-mobile”. As minhas botas eram boas, mas não boas o suficiente, por isso de tempos em tempos eu precisava andar um pouco para aquecer os meus pés. Acho que eu trouxe roupas muito boas, porque eu não senti frio nem nas pernas e nem no corpo, o meu tronco estava bem aquecido, as únicas partes que eu sentia frio era nos pés e nas mãos, mas não o tempo todo, acontecia quando eu ficava meia hora parado sobre o snow-mobile. Percebi uma coisa que é obvia: As roupas quentes protegem o seu corpo contra o frio exterior, mas para você se sentir aquecido, o seu corpo precisa produzir calor. Outra coisa bastante interessante é que na primeira volta na trilha eu não senti frio, porque precisava descer toda hora para arrumar os galhos e etc. Já na segunda volta, eu pedi para o Mark para deixar eu caminhar um pouco, e depois de uns duzentos metros eu já sentia o meu corpo aquecido novamente. Já na terceira volta eu precisei andar uns 600 metros até os meus pés se aquecerem novamente, parecia que quanto mais tempo eu passava exposto ao frio mais difícil era para o meu corpo produzir calor.
Mas em torno das quatro horas da tarde o serviço estava feito e voltamos para o Lodge, onde pude me aquecer finalmente. Minha pele estava péssima, até assustei quando olhei no espelho, meu rosto estava branco e vermelho ao mesmo tempo! Foi só depois de um bom banho que eu voltei a ter esse rostinho bonito que vocês conhecem!
Sim, eu estava realmente quebrado de noite, cansado pra caramba. Mas fiquei sabendo que enquanto eu estava na trilha o BS e o Bidula foram à cidade acertar a transferência e o seguro obrigatório do carro. O problema é que o seguro aqui não é no carro, mas nos motoristas, e é caro pra caramba, por isso resolvemos deixar “segurado” apenas o BS, e dividir o valor, que saiu perto de mais cem dólares cada um.
E mais à noite, nove e meia, lá estavam os três brasileiros dentro do nosos Honda Prelude em direção à Grand Marais onde íamos na festa de aniversário de uma das intercambistas do Peru. Fomos bem devagar porcausa da quantidade de veados ao lado da estrada, eram muitos mesmo! Acho que no total foram uns cinquenta contando a ida e a volta! E o medo de um deles passar correndo na estrada e pular na frente gelando as nossas veias.
O mais engraçado é que as peruanas não falam inglês (Como elas chegaram aqui? Também não sei), então a comunicação era naquele portunhol arranhado que todo brasileiro consegue falar quando precisa. Voltamos cedo, voltei dirigindo, porque o Bidula havia bebido dois copos de vinho e o BS uma lata de cerveja. (Eu sei que isso não é quantia pra deixar ninguém alcolizado, mas como eu não havia bebido nada, e tinha os veados na estrada, eu peguei as chaves.) Eita carrinho forte, tenho que tomar cuidado para não sair arrancando na primeira marcha…
O Bidula chegou no quarto, tirou o tênis, deitou na cama e apagou. Foram menos de dez segundos o tempo dele entrar no quarto e estar em sono profundo. O pior é que no dia seguinte, hoje, tivemos uma reunião com a chefe oito horas da manhã…
Última coisa que estava nas minhas notas pra eu escrever no blog: Fiquei sabendo ontem do rolo que deu na internet brasileira, de um juiz proibindo o Youtube porcausa do vídeo da Cicarelli. Que coisa mais idiota! E quando você vê essas coisas idiotas daqui nem dá vontade de voltar para o Brasil.
Mas quando eu lembro das pessoas que estão me esperando de volta, eu fico com uma baita saudade daquela terra de palmeiras onde gorgeiam os passarinhos.
Tirei algumas fotos antes de sair para a festa. Depois nem pensei em tirar mais fotos…
BS posando de motorista…
Essa eu tirei para quem não sabe o que é um snow-mobile. (Estava estacionado ao lado do nosso carro)